Libro: Educação superior iberoamericana

Por: CLACSO.

Uma análise para além das perspectivas mercadológicas da produção de conhecimento

Maria de Lourdes Pinto de Almeida. Afrânio Mendes Catani. [Organizadores] 

César Tello. Rosel Bolívar Ruano. Antonio Bolívar. José Camilo dos Santos Filho. Sandra Veit Pillatti. Elton Luiz Nardi. Carlos Francisco Mazzola. María Verónica Leiva Guerrero. María Leonor Conejeros Solar. Mirian Lúcia Gonçalves. Elisabete Monteiro de Aguiar Pereira. Joviles Vitório Trevisol. Margarita Victoria Rodriguez. Silvia Helena Andrade de Brito. Luiz Carlos Lückmann. Regina Maria Michelotto. Catarina Almeida Santos. Mariluce Bittar. Wercy Rodrigues Costa Júnior. João dos Reis Silva Jr.. Fabíola Bouth Grello Kato. Luciana Rodrigues Ferreira. António Francisco Cachapuz. [Autores de Capítulo]
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ISBN 978-987-722-073-5
CLACSO.
Buenos Aires.
Abril de 2015

A universidade ocupa uma posição central para se promover um desenvolvimento conjunto e auto-sustentado. É a partir dela que se pode articular um amplo programa de Pesquisa & Desenvolvimento que contemple os mais variados interesses sociais. O próprio papel da pesquisa acadêmica se redefine em função dessa problemática da soberania nacional. Contudo, a sobrevivência da universidade dependerá dos financiamentos. Isso poderá lançá-la definitivamente na concorrência do mercado do conhecimento, tornando-a direcionada pelos interesses imediatos do mercado e pelos imperativos da demanda industrial. Nesse sentido, ela tenderá a ser um prolongamento da pesquisa industrial, mantendo seu tradicional processo de reprodução de seus quadros com fundos públicos. Por outro lado, a universidade pública pode se reafirmar como um centro de ressonância dos problemas nacionais, e determinar-se conforme um projeto mais vasto no qual o mercado, as empresas estariam subordinados aos interesses mais amplos de um desenvolvimento econômico não excludente internamente e não subordinado externamente.
Fonte do documento: https://clacso.org.ar/libreria-latinoamericana/contador/sumar_pdf.php?id_libro=977
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Entrevista com Sandra Goulart, reitora da UFMG: ‘Não há país sem educação, ciência e tecnologia’

Por. Junia Oliveira

Terceira mulher a assumir a maior universidade do estado fala sobre aperto orçamentário, avalia que a Lei do Teto pode sufocar o setor, mas diz que atividade fim é intocável na UFMG.

Em 90 anos de história, ela é a terceira mulher a ocupar o cargo máximo da Universidade Federal de Minas Gerais, maior instituição de ensino superior do estado e uma das mais importantes do país. A professora Sandra Goulart assumiu a reitoria  e fica no comando até 2022, com o vice-reitor, Alessandro Fernandes Moreira. Vice-reitora na gestão anterior, ela pretende manter e expandir programas, além de enfrentar desafios com inovação e administrar a já longa crise de orçamento. Com dinheiro a menos no caixa e valores ainda retidos nos cofres da União, a nova dirigente garante que não mexe nas ações de ensino, pesquisa e extensão, mas prevê dias difíceis diante da Lei do Teto dos Gastos Públicos, que estipula limite para despesas durante  duas décadas. Em entrevista ao Estado de Minas, ela fala sobre esses e outros assuntos, como inclusão, prioridades, autonomia universitária, regras e supostas fraudes à política de cotas. Confira os principais trechos.

Que pontos da gestão anterior serão mantidos e o que muda?
Na parte acadêmica conseguimos manter, apesar de toda a crise orçamentária que vivemos nos últimos anos, a qualidade dos nossos programas, tanto da graduação quanto da pós. A UFMG recebeu a nota máxima nos dois quesitos principais do MEC (Ministério da Educação), coisa que apenas outras três universidades obtiveram. Ela tem nota 5 no Índice Geral dos Cursos  e na avaliação que ocorreu in loco em 2016. Também tivemos avaliação dos programas de pós-graduação e foi comprovado que 63% dos nossos cursos são de qualidade internacional. Expandimos muito as redes de extensão, bem como os programas em parceria com a comunidade e com movimentos sociais. E fizemos toda uma gestão voltada para a inclusão, em paralelo à qualidade. Criamos a Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis, o Núcleo de Acessibilidade e Inclusão e elaboramos uma política dos direitos humanos muito importante. Vamos manter e expandir esses programas.

Quais são os desafios?

Um dos que temos colocado para as universidades de modo geral é pensar a produção de conhecimento em um novo contexto. Hoje, temos cada vez mais de nos mover para uma perspectiva transdisciplinar para a solução de problemas. Precisamos preparar nossos cursos de graduação e de pós para isso, favorecendo temas que são importantes para nosso país e para a humanidade. Isso será uma das prioridades. Temos também de pensar em um contexto mais amplo. A UFMG hoje é muito diferente do que era há 20, 30 anos, pois é cada vez mais inclusiva e precisa ser, para atender às demandas do nosso país. Temos 50% de nossos alunos vindos do ensino público e a cota para pessoas com deficiência. Mas, com isso, vem também uma série de desafios, pois temos de dar condições para que esses estudantes permaneçam, via políticas de assistência estudantil e de ações afirmativas. Outro desafio é pensar a questão da inovação no contexto mais amplo, e não só na transferência de tecnologia.

Os contingenciamentos estão equacionados?
Nossa grande preocupação é com a Lei do Teto dos Gastos Públicos, que deve valer por 20 anos. Se olharmos na Lei de Orçamento Anual, no MEC ou Ministério do Planejamento, o orçamento aumentou. Só que o que aumentou foram gastos que são relativos a salários ou aposentadorias, e não o gasto real. Nosso orçamento, hoje, pensando comparativamente, é menor do que no ano passado, com um agravante que para nós é muito sério. A verba da universidade vem como custeio e como capital, que é para obras, e esta continua contingenciada. Ao longo dos anos, foi contingenciada em quase 70%. A longo prazo, a Lei do Teto impõe uma realidade extremamente preocupante, porque o orçamento não pode aumentar. Se não tem como, e a despesa vai sempre crescer, por exemplo, em termos de pessoal, teremos de tirar de algum lugar. A verba para a manutenção da universidade acabará sendo muito diminuída em 20 anos. A gente não pode descontinuar os avanços que tivemos com relação às universidades no nosso país. Investimento em educação, ciência e tecnologia tem que ter perenidade. É investimento, não é gasto.

Só se poderá aumentar a despesa com pessoal? 
Não, nem isso. O orçamento é tudo: é salário nosso, aposentadorias e outros. No salário tem dissídio, tem aposentadoria, o gasto sobe, independentemente de o governo querer. Se aumenta, e há um teto dos gastos públicos, há que se tirar de algum outro lugar. A luz, por exemplo, vai aumentar consideravelmente em breve. Os gastos vão aumentar e para honrá-los terei de tirar de algum lugar, porque meu orçamento não pode crescer, devido ao teto de 20 anos. A gente até entende que isso foi pensado para manter as contas, mas é incoerente nas áreas que são prioritárias para o governo e a sociedade, que são educação e saúde. Isso é muito preocupante.

A universidade está tendo de se adequar, como outras fizeram no ano passado, a ponto de cortar até insumos como papel higiênico?
Nós ainda não sabemos como será (este ano). No passado, tivemos de fazer alguns cortes. Temos priorizado as ações fim da universidade, que são ensino, pesquisa e extensão. E onde podemos reduzir os gastos, temos reduzido. Houve redução grande em relação às obras, que estão paradas. Concluímos duas agora: o prédio de atividades didáticas de exatas (CAD 3) e a moradia universitária. Mas temos algumas paradas por falta justamente de orçamento para capital e obras. Tivemos que fazer opções. Agora aguardamos para ver se esse orçamento previsto será todo liberado.

Em todo o ano passado ficou a expectativa e ele não apareceu…
Todo contingenciamento é danoso para a universidade. O nosso orçamento hoje é cerca de 6% menor do que do ano passado. Isso já nos coloca um certo gargalo. A universidade é uma instituição séria, isso é importante destacar, comprometida, ciosa de uma gestão equilibrada. Faremos todas as gestões possíveis, mas é importante também destacar isso: o teto dos gastos públicos terá impacto no futuro muito grande para as universidades públicas. E não só para elas, mas para toda a área de educação e saúde.

Há resultado da sindicância aberta para apurar o caso das supostas fraudes em cotas raciais?
A sindicância está no rito final. Em breve teremos resultado. É importante destacar, primeiro, a importância dessa política de cotas para a universidade e para a sociedade de modo geral, tanto as cotas socioeconômicas quanto as raciais. Elas estão atendendo a uma demanda para quem de fato esteve excluído do ensino superior durante esses anos. O que temos de fazer é que essa política atinja as pessoas que de fato necessitam, e a universidade está muito atenta a isso. Vai investigar sempre que houver dúvida ou questionamento de fraude, que de fato é inaceitável. A sindicância dá direito ao contraditório e à ampla defesa. Caso seja comprovada fraude, a pessoa pode ser punida inclusive com a expulsão. Estamos também criando mecanismos para que isso não ocorra. Temos agora uma carta que pedimos que seja preenchida (pelo candidato) e, além disso, teremos comissão permanente de acompanhamento das questões relacionadas às cotas.

A carta foi usada na entrada deste início de ano? Houve algum caso julgado improcedente?

O objetivo dessa carta em um primeiro momento é de que as pessoas se conscientizem sobre o objetivo das cotas. Quando o candidato ou candidata tem que parar e preencher um documento dessa natureza vai pensar: “Eu tenho mesmo direito a isso? Estou dentro desse grupo que precisa de uma reparação histórica?”. O segundo momento é, claro, em casos em que tivermos alguma dúvida. Se houver questionamento em relação à adequação de algum candidato, essa carta será usada também.

Houve algum resultado?
Não é uma questão de resultado. A gente não vai ler e falar: “Isso aqui sim, isso aqui não”. Essa não é a função. A função é que a pessoa se conscientize e, em caso de dúvida, vamos cotejar isso com os outros documentos que foram apresentados, porque há também o aspecto da cota da escola pública. Se houver questionamento em relação a uma determinada pessoa, vamos avaliar os documentos. Se for comprovado que há possibilidade de fraude, abre-se a sindicância.

Dos quatro alunos denunciados em 2017 por terem supostamente burlado as cotas, que foram alvo de sindicância, um falou que ia pedir desligamento. Ele e os demais continuam estudando?
O que posso dizer é que aqueles alunos sobre o quais temos dúvida e registro de que possam ter burlado a cota estão na listagem que a comissão está avaliando.

Diante do cenário político, bem indefinido, e com possibilidade de grande polarização, a universidade entende que tem também o papel de se posicionar politicamente?

A UFMG se posiciona dentro da sua missão principal, que é a defesa da educação pública, gratuita, de qualidade, de referência para nosso estado e nosso país. Temos de defender também algo que para nós é muito caro, que é a autonomia universitária, autonomia de pensamento, liberdade didático-pedagógica, laicidade (independência da influência religiosa), de administrar seus próprios recursos. A UFMG não se coloca de forma partidária, mas se coloca em defesa de valores que para nós são importantes. A UFMG e a universidade pública no país não tratam apenas nossos estudantes para uma carreira ou para uma formação acadêmica, formam também cidadãos e cidadãs que vão atuar na sociedade. Defenderemos as pautas que vão ao encontro daquilo em que acreditamos e que é a missão da universidade, em defesa não só da universidade pública, gratuita e de qualidade, em defesa da ciência e tecnologia. Porque disso depende o nosso país. Não há país sem educação, ciência e tecnologia. Disso, nós não abriremos mão. Estaremos sempre do lado daqueles que defendem esses valores que para nós são tão caros.

Ano passado, a reitoria foi alvo de operação da Polícia Federal (relativa a investigação sobre uso de dinheiro destinado ao projeto do Memorial da Anistia Política do Brasil) e integrantes da cúpula da universidade foram conduzidos coercitivamente. Como está o processo?
A investigação está sub judice. E a mim, enquanto dirigente máxima da instituição, não cabe me manifestar sobre esse assunto. Estamos convictos, primeiro, da seriedade das nossas ações, da seriedade de uma instituição do porte da UFMG, que é um patrimônio do nosso estado e do nosso país. É uma instituição séria, responsável, transparente. Estamos com a consciência tranquila e com a certeza do dever cumprido. Confiamos que as apurações elucidarão todas as circunstâncias e a UFMG se mantém, como sempre se manteve, à disposição das autoridades.

Fonte:
https://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2018/04/08/interna_gerais,949969/entrevista-com-sandra-goulart-reitora-da-ufmg-nao-ha-pais-sem-educa.shtml
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